Brasil espera participação privada, nacional ou estrangeira, para avançar na ampliação do uso da Medicina Nuclear

Brasil espera participação privada, nacional ou estrangeira, para avançar na ampliação do uso da Medicina Nuclear

O espaço do Projeto Perspectivas 2023 do site Petronotícias abriu, no último dia 5, um espaço para um segmento fundamental da nossa ciência: a Medicina Nuclear. Por isso, foi convidada a especialista Ana Celia Sobreira, da Acerts Nuclear, que traz uma experiência em Medicina Nuclear de mais de 40 anos nas áreas que envolvem o emprego da tecnologia nuclear – saúde, indústria e pesquisa. Ana Sobreira foi diretora do Centro de Medicina Nuclear da Faculdade de Medicina da USP; diretora da Divisão Nuclear da empresa REM; CEO da empresa Eckert & Ziegler Brasil (implantação, licenciamento e operação desta empresa). A participação da energia nuclear já avançou muito no Brasil, mas como ela mesmo diz, “ainda está muito atrasada, se compararmos aos países de primeiro mundo”. De uma certa forma, isso acaba sendo positivo, porque há muito a ser feito. Muito para se desenvolver e evoluir. E apesar de todas essas dificuldades, ainda assim, tem salvado muitas vidas. O seu otimismo de outrora pela construção do nosso Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) para ampliar a produção de radiofármacos já ficou para trás. Ela olha agora com os olhos brilhando para a participação de capital privado neste setor. Seja nacional ou estrangeiro. Para ela, esta é a chave e liga fundamental que o setor precisa para crescer, se desenvolver e atender a nossa população. Veja o que ela diz nesta importante entrevista, de olho no desenvolvimento deste tema a partir deste ano e olhando para o futuro:

Como está a Medicina Nuclear hoje no Brasil?

Molibdênio
Molibdênio

Considera-se que a Medicina Nuclear brasileira esteja cerca de 20 anos atrás em relação aos países desenvolvidos. Analisando o cenário passado, percebemos que o monopólio da União para a aquisição, manipulação, produção, armazenamento e comercialização de radioisótopos foi um dos enormes freios para o desenvolvimento da especialidade. A partir de 2022, quando o monopólio foi flexibilizado, espera-se a adoção de políticas de incentivo.

Onde o país deveria estar no campo da Medicina Nuclear?

A MN do Brasil poderia estar entre as mais desenvolvidas do mundo. O País tem pessoal capacitado para desenvolver novos radiofármacos, entretanto, não há condições para o desenvolvimento de pesquisas; os profissionais não são remunerados adequadamente; não há política com este objetivo; excelentes pesquisadores deixam o País. Para mudar esta situação brasileira, é preciso dar saltos grandes e isso pode ser feito se empresas privadas investirem aqui. É preciso de proatividade, ter coragem de ser protagonista das mudanças necessárias.

Que tipo de produtos o Brasil importa e de onde para atender ao mercado brasileiro?

Medicamentos de Medicina Nuclear

O molibdênio-99, matéria-prima para a produção de gerador de tecnécio-99m, é importada da Rússia, África do Sul, Bélgica entre outros. Importa-se, também, dos mesmos países, o iodo-131. Importa o gerador de gálio-68. Atualmente todos os radioisótopos de meia-vida média ou longa, são importados. No Brasil é produzido o flúor-18, de meia-vida curta, em cíclotrons.

Todos os estados brasileiros recebem os remédios da Medicina Nuclear?

A logística para a distribuição do material radioativo para uso médico é complexa e cara. Devido às dimensões continentais do País, o modal aéreo é o de escolha para o transporte – algumas empresas aéreas não transportam produtos radioativos; o preço praticado por aquelas que aceitam transportar MR não condiz com a realidade brasileira e especialmente da especialidade, tornando quase inviável alguns serviços de MN distante da Região Sudeste. É importante dizer que o SUS não atualiza, há 15 anos, a tabela de valores da remuneração para os serviços de MN.

Como ele poderia ser mais eficiente para a população já em 2023?

Ressonância magnética

Para que a MN possa estar disponível para toda a população do País, é preciso que haja atualização dos valores de remuneração do SUS; é preciso que haja decisão governamental corajosa no sentido de incentivar empresas privadas a investir no País; é preciso estimular o ensino e a pesquisa; é preciso criar políticas que assegurem os investimentos privados. Novos radiofármacos trabalham dentro de um conceito conhecido no meio médico como “teranóstico”, isto é, uma junção entre terapêutica e diagnóstico. Para possibilitar teranóstico precisamos de novos radioisótopos que ainda não conseguimos importar e, muito menos, produzir.

Qual é a importância da construção do Reator Multipropósito Brasileiro?

Radioisótopo

A construção do RMB, por si só, não resolverá as dificuldades para o desenvolvimento da MN. Além do que, é preciso considerar que um projeto dessa natureza leva até dez anos para estar concluído, se não houver nenhum óbice durante o seu desenvolvimento. O projeto brasileiro já tem 15 anos em desenvolvimento. Precisamos de política forte e corajosa de abertura do mercado para o investimento de empresas privadas. Indústrias farmacêuticas têm patrocinado e investido no desenvolvimento de novos produtos para uso em terapia e têm tido enorme sucesso nos resultados. De maneira geral, o ambiente de negócios ainda não é favorável o suficiente para atrair empresas que poderiam trazer esses novos medicamentos para o país.

Como a logística poderia melhorar a distribuição dos remédios usados na Medicina Nuclear?

A logística é uma das ferramentas para ajudar no desenvolvimento da especialidade, entretanto, não viabiliza o uso de radioisótopos de meia-vida curta. É preciso que haja política de desenvolvimento de projetos de instalações produtoras em regiões mais distantes da Região Sudeste.

Medicina Nuclear

Onde, na medicina, equipamentos e remédios radiofármacos são usados e o que eles combatem?

A Medicina Nuclear é usada especialmente para diagnóstico na cardiologia, neurologia, endocrinologia e oncologia, entre outras. Mais recentemente, a partir de novos desenvolvimentos na Austrália, EUA e países da Europa, surgiram produtos para uso em terapia, com resultados que têm surpreendido muito positivamente, especialmente na oncologia.

A entrevista foi publicada originalmente no site Petronotícias.

Fotos: Divulgação Petronotícias

Fonte: Petronotícias