Nota da ABEN: rebatendo a inverdade sobre Angra 3

Nota da ABEN: rebatendo a inverdade sobre Angra 3
Rio de Janeiro, 27 de janeiro de 2025

A Associação Brasileira de Energia Nuclear (ABEN) vem a público prestar esclarecimentos sobre a importância da retomada das obras de construção da Usina Nuclear Angra 3 para o desenvolvimento energético do País e o fortalecimento do Programa Nuclear Brasileiro (PNB). Segundo o estudo entregue pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) à Eletronuclear em setembro de 2024 sobre a viabilidade técnica, econômica e jurídica da planta, os custos de abandonar ou finalizar o projeto são similares – aproximadamente R$ 21 bilhões e R$ 23 bilhões, respectivamente.

O empreendimento gerará cerca de 7 mil empregos diretos, no pico da obra, além de um número muito maior de empregos indiretos, bem como contribuirá ainda mais para a diversificação da matriz elétrica e reduzirá os custos totais do Sistema Interligado Nacional (SIN), pois substituirá a energia gerada por usinas térmicas que apresentam alto custo de geração e são frequentemente despachadas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Pode-se afirmar que não cabe mais discussão sobre a necessidade ou não da retomada da construção da terceira usina nuclear do Brasil. Não concluir Angra 3 é lançar um descrédito imensurável sobre o Programa Nuclear Brasileiro, com reflexos nos avanços significativos que o País conquistou com muito sacrifício nas últimas décadas.

Ainda no aspecto financeiro, o “Estadão” publicou Editorial nesta segunda-feira, dia 27/01, no qual informa que a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) teria calculado, em estudo ao qual o veículo teve acesso, que a retomada de Angra 3 custaria “até R$ 61,55 bilhões a mais nas contas de luz dos brasileiros ao longo de 40 anos a partir de 2031”. Contudo, a ABEN rebate tal inverdade com base na nota de esclarecimento divulgada no último dia 14 pela própria EPE.

De acordo com a empresa, “foram feitas simulações com diversas fontes e essas comparações foram qualificadas em relação à sua comparabilidade com os serviços ao sistema que serão prestados pela [Unidade Termonuclear] UTN Angra 3. Os valores destacados na matéria são aqueles avaliados pela EPE como de baixa comparabilidade com a UTN Angra 3, pois ou são baseados em geração renovável variável (serviços distintos) e não incluem custos sistêmicos de back-up, estabilidade e rede/conexão (os quais podem superar US$ 50/MWh em cenários com 75% de renováveis variáveis na matriz elétrica, de acordo com a OCDE) ou não incluem externalidades (custos externos) como os custos de abatimento de carbono após 2031 (diversos estudos internacionais apontam para preço de carbono em torno de US$ 100/tCO2eq, o que adicionaria US$ 34/MWh em [Unidade Termelétrica] UTE a gás natural, por exemplo)”.

Ainda de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética, “a comparação nesse ponto citado do estudo tampouco considera o custo de oportunidade do abandono do projeto avaliado pelo BNDES, o qual é abordado em outra parte do relatório da EPE, que tem quase 300 páginas de avaliação. O relatório também aborda aspectos de confiabilidade e resiliência do sistema. As condições de regularidade e qualidade do fornecimento de eletricidade impactam o custo para o consumidor. Então, a comparação não pode ser direta. Esses pontos estão ressaltados no relatório da EPE”.

E conclui informando que seu relatório é bem mais amplo do que a matéria aborda e que Angra 3 deve ser construída para evitar custos elevados de abandono. A construção de UTN Angra 3 também “ajuda a moderar custos sistêmicos, provê segurança energética e confiabilidade para o sistema, e contribui para aumentar a descarbonização e a resiliência climática da matriz energética nacional. Ademais, a construção de Angra 3 evita arrependimentos futuros associados à perda do domínio tecnológico e à desmobilização da cadeia de fornecedores de bens e serviços no Brasil”.

O “Estadão” também destaca que a conclusão de Angra 3 seria especialmente desafiadora porque a usina possui uma tecnologia mais antiga do que a atualmente adotada. Trata-se de um equívoco, pois, a despeito de a usina ser considerada “irmã gêmea” de Angra 2, terá equipamentos de Instrumentação e Controle digital no mesmo padrão dos projetos mais recentes de usinas nucleares, o que deve contribuir para um melhor desempenho e segurança da planta. Em suma, a sala de controle de Angra 3 refletirá o estado da arte em projetos de sala de controle.

Com relação à operadora das usinas nucleares brasileiras, entre elas a futura Angra 3, cabe destacar que a Eletronuclear exerce sua função com maestria, tendo em vista que frequentemente suas duas plantas em operação, Angra 1 e Angra 2, figuram no ranking das melhores centrais nucleares do mundo em termos de desempenho e produtividade. Com apenas essas duas unidades gerando eletricidade segura, limpa (praticamente não emite gases de efeito estufa), firme, constante e de base, a empresa, acaso tivesse sua gestão compromissada apenas com Angra 1 e Angra 2, teria oxigênio financeiro robusto, posto que não estaria vinculada aos empréstimos e obrigações contratuais ligadas ao empreendimento de Angra 3. Caso esse projeto não prossiga, poderá aniquilar financeiramente a Eletronuclear. É preciso, portanto, retomar efetivamente as obras de construção de Angra 3, equacionando o seu financiamento, pois obra cara é obra parada.

Ainda no contexto financeiro, estudo apresentado em fevereiro de 2024 pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) revelou os efeitos econômicos positivos gerados pelos investimentos em energia nuclear. Solicitado pela Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan), o trabalho aponta que cada R$ 1 bilhão investido na nucleoeletricidade gera 22,5 mil empregos no país e um acréscimo de R$ 2 bilhões para o PIB nacional, além de um aumento de R$ 3,1 bilhões na produção do país. Cumpre ressaltar que a energia nuclear não recebe subsídios como outras fontes energéticas, que “estudiosos” costumam defender sem embasamento técnico.

Centrais nucleares são fatores de indução de desenvolvimento socioeconômico, pois acarretam na criação de muitos empregos de alto nível, movimentando as economias locais, regionais e nacional. Nenhum novo empreendimento no Estado do Rio de Janeiro tem tamanha magnitude como o de Angra 3. Com potência instalada de 1.405 megawatts (MW), a unidade será capaz de produzir cerca de 12 milhões de megawatts-hora (MWh) anuais, o suficiente para atender 4,5 milhões de pessoas, ocupando um espaço de mero 0,08 km². Para se ter uma ideia, dentro do Estádio do Maracanã, cabem duas usinas do tamanho de Angra 3, e ainda sobra espaço. Comparativamente, fontes diferentes gerando 1.405 MW ocupam áreas de 40 km² (usina solar fotovoltaica), 125 km² (hidrelétrica) e 400 km² (eólica).

A energia nuclear está em franca expansão no mundo, com 62 usinas em construção (capacidade instalada de 64.461 megawatts-elétricos – MWe), segundo o Sistema de Informação de Reator de Potência da Agência Internacional de Energia Atômica (Pris/IAEA, na sigla em inglês).

Além do Brasil, com Angra 3, muitos países estão investindo em novas usinas nucleares, como China, Índia, Turquia, Egito, Rússia, Reino Unido, Coreia do Sul, Japão, Bangladesh, Ucrânia, França, Eslováquia e Argentina. Países que abandonaram a energia nuclear, como a Itália, estudam reintroduzir a fonte em suas matrizes. Outras nações, como Bélgica e Suíça, que tomaram a decisão de abandonar a nucleoeletricidade, discutem sobre a possibilidade de manter suas centrais nucleoelétricas ativas por mais tempo do que o previsto originalmente. Em efervescência, os pequenos reatores modulares (Small Modular Reactors – SMRs) também geram atualmente mais de 80 projetos conceituais em todo o mundo.

Muito se fala sobre rejeitos, mas, diferentemente de outras indústrias, a nuclear é a única que os armazena de maneira controlada, segura e catalogada, como se tivessem “CPF”. Além disso, o volume de rejeitos da geração nuclear é infinitamente inferior ao de outras fontes, como solar e eólica, que são intensivas no uso de minerais oriundos de terras-raras. A indústria nuclear também tem pouquíssimos acidentes. O número de vítimas por MWh gerado é muito inferior ao de setores como os de petróleo, carvão, solar e eólico. Uma mentira contada mil vezes jamais tornar-se-á uma verdade!

Fontes renováveis como solar e eólica são importantes, mas complementares, pois são intermitentes, com fatores de capacidade muito inferiores aos da nuclear. Lembremos do apagão de energia ocorrido em 15/08/2023 em diversas regiões do Sul, Sudeste, Norte e Nordeste do País que, segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), causou a interrupção de 16 mil MW de carga. A triste ocasião fortaleceu a discussão sobre a necessidade de traçar estratégias para garantir a segurança energética em um cenário de constante crescimento das fontes renováveis na matriz brasileira. Outro exemplo que vale citar reside na Alemanha, que abandonou a energia nuclear, investindo maciçamente em fontes renováveis, e se depara com declínio de sua indústria e da geração de energia. Além disso, a maior economia da Europa passou de exportadora para importadora de eletricidade.

O Brasil, que precisa de energia nuclear, deve começar a tratá-la como Política de Estado. A retomada de Angra 3 será fundamental para a geração de riqueza e de energia limpa e segura, o fortalecimento da cadeia produtiva do setor e a expansão da nucleoeletricidade no País, sendo o pontapé necessário para a implantação de novas usinas, conforme previsto no Plano Nacional de Energia – PNE 2050.

Por fim, não podemos nos esquecer de mencionar as inúmeras aplicações pacíficas da energia nuclear, em setores como medicina, indústria, meio ambiente, agricultura, preservação de bens e acervos culturais e propulsão naval e espacial. Assim como Angra 3, o País precisa tratar com mais carinho importantes empreendimentos que devem sair do papel, como o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), o Submarino Convencionalmente Armado com Propulsão Nuclear (SCPN), o Projeto Santa Quitéria, de mineração de urânio como subproduto do fosfato, e o Centro Tecnológico Nuclear e Ambiental (Centena), bem como ativar a já criada Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN).