Por Leonam dos Santos Guimarães
A utilização da energia nuclear para gerar eletricidade para uso civil marcou uma revolução na indústria de energia e desempenhou um papel fundamental no contexto político e econômico da Guerra Fria. As três primeiras usinas nucleares do mundo a entrar em operação foram as seguintes:
1. Usina Nuclear de Obninsk (URSS): A Usina Nuclear de Obninsk entrou em operação em 27 de junho de 1954, tornando-se a primeira usina nuclear do mundo a gerar eletricidade para uso civil.
2. Central Nuclear de Calder Hall (Reino Unido): A Usina Nuclear de Calder Hall entrou em operação em 1956. A primeira de suas quatro unidades começou a operar em outubro de 1956.
3. Usina Nuclear de Shippingport Atomic Power Station (EUA): A Usina Nuclear de Shippingport entrou em operação em 1957, com a primeira criticalidade de seu reator em 2 de dezembro de 1957 e sua primeira geração de eletricidade em 17 de dezembro de 1957.
Essas usinas pioneiras foram marcos na história da energia nuclear, demonstrando a aplicação pacífica da energia atômica para a geração de eletricidade. Elas contribuíram para o desenvolvimento posterior da tecnologia nuclear nos seus países e estabeleceram a base para a expansão da energia nuclear civil em todo o mundo.
A Usina Nuclear de Obninsk é um marco fundamental na história da energia nuclear, sendo a primeira usina nuclear do mundo a gerar eletricidade para uso civil. Os reatores que a precederam eram todos dedicados apenas à produção de plutônio para uso militar.
A história da Usina Nuclear de Obninsk começa no início da Guerra Fria, uma época em que as superpotências, incluindo a União Soviética, estavam envolvidas em uma corrida armamentista nuclear. Em meio a essa rivalidade, a União Soviética buscou estabelecer sua capacidade tecnológica na área nuclear e demonstrar seu compromisso com o uso pacífico da energia nuclear.
O projeto da Usina Nuclear de Obninsk teve início em meados da década de 1950. A usina foi projetada para ser um reator de pesquisa experimental, mas também visava à geração de eletricidade para atender às necessidades da cidade de Obninsk e da região circundante.
A construção da usina foi concluída em tempo recorde, e em 27 de junho de 1954 entrou em operação, estabelecendo um marco na história da energia nuclear. A Usina Nuclear de Obninsk apresentava as seguintes características técnicas:
Utilizava o reator RBMK-1000, que era refrigerado a água fervente e tinha grafite como moderador. Foi o protótipo inicial do modelo de Chernobyl. A usina tinha uma capacidade de produção de eletricidade de cerca de 5 megawatts, o que era muito modesto em comparação com as usinas nucleares modernas. Utilizava urânio enriquecido e urânio natural. Suas características permitiam a produção de plutônio para uso militar.
A Usina Nuclear de Obninsk desempenhou um papel significativo na promoção do uso pacífico da energia nuclear. Além de gerar eletricidade, a usina produziu radioisótopos para aplicações médicas e industriais, o que a tornou uma instalação importante para a produção de materiais radioativos.
Após décadas de operação, a Usina Nuclear de Obninsk foi desativada em 2002. Seu legado como pioneira na geração de eletricidade nuclear e promotora do uso pacífico da energia nuclear continua a ecoar na história da energia nuclear em todo o mundo. Ela demonstrou que a energia nuclear poderia ser utilizada de forma segura e eficaz para geração de eletricidade e serviu como base para o desenvolvimento subsequente de usinas nucleares tipo RBMK, de triste histórico com o acidente de Chernobyl.
A Central Nuclear de Calder Hall é uma parte importante da história da energia nuclear no Reino Unido e no mundo. Ela foi a primeira usina nuclear comercial do mundo a gerar eletricidade em larga escala e teve um papel fundamental na promoção do uso da energia nuclear para fins civis e na produção de eletricidade.
A história da Usina Nuclear de Calder Hall começa no período pós-Segunda Guerra Mundial, quando o Reino Unido enfrentava desafios significativos na reconstrução de sua economia e no atendimento à crescente demanda por eletricidade. Além disso, o Reino Unido estava imerso na Guerra Fria e buscava estabelecer sua própria capacidade nuclear.
O projeto da Usina Nuclear de Calder Hall começou em 1947. A usina foi projetada para ter quatro reatores resfriados a gás e moderados a grafite, conhecidos como reatores Magnox, que utilizavam urânio natural como combustível e dióxido de carbono como refrigerante.
A construção da usina foi concluída em tempo recorde, com o primeiro reator alcançando a primeira criticalidade em outubro de 1956, quando a primeira unidade Hall foi oficialmente inaugurada pela Rainha Elizabeth II, tornando-se a primeira usina nuclear comercial do mundo a gerar eletricidade em larga escala para uso civil.
A Usina Nuclear de Calder Hall apresentava as seguintes características técnicas: quatro reatores Magnox; capacidade total de produção de eletricidade da usina era de 50 megawatts, um marco significativo para a época; utilizava urânio natural encapsulado em revestimento de magnésio, o que dá origem ao nome “Magnox”; e dióxido de carbono como fluido de resfriamento.
Calder Hall desempenhou um papel fundamental na promoção do uso da energia nuclear para fins civis e na produção de eletricidade em larga escala. Ela serviu como modelo para usinas nucleares comerciais em todo o mundo, especialmente aquelas que adotaram reatores grafite-gás, como foi o caso da França.
Além disso, a produção de plutônio como subproduto desempenhou um papel importante no programa nuclear militar do Reino Unido. No entanto, é importante ressaltar que a ênfase estava no uso pacífico da energia nuclear, e a usina contribuiu para atender à crescente demanda por eletricidade e promover o desenvolvimento econômico do Reino Unido. A central permaneceu em operação por várias décadas, com seu último reator encerrando atividades em 2003.
A Usina Nuclear de Shippingport é uma parte significativa da história da energia nuclear nos Estados Unidos, sendo a primeira usina nuclear comercial a ser projetada, construída e operada no país. Ela desempenhou um papel crucial no desenvolvimento e na promoção do uso pacífico da energia nuclear, além de servir como um marco na Guerra Fria.
No início da década de 1950, os Estados Unidos estavam imersos na Guerra Fria com a União Soviética. O projeto da propulsão do primeiro submarino nuclear foi desenvolvido de forma acelerada. A primeira criticalidade do protótipo em terra da propulsão do Nautilus ocorreu em 17 de dezembro de 1954.
O país estava comprometido com o desenvolvimento de tecnologia nuclear tanto para fins militares quanto civis. Nesse cenário, o presidente dos Estados Unidos, Dwight D. Eisenhower, fez um discurso em 1953 na Assembleia Geral das Nações Unidas, propondo uma iniciativa chamada “Átomos para a Paz”. A ideia por trás desse programa era utilizar a energia nuclear para fins pacíficos, promovendo a cooperação internacional e a segurança global.
Em resposta à iniciativa “Átomos para a Paz”, o governo dos Estados Unidos, em cooperação com a indústria de energia elétrica, lançou o projeto da Usina Nuclear de Shippingport. O projeto foi supervisionado pelo Departamento de Energia dos EUA (na época, chamado de Atomic Energy Commission) através da equipe que desenvolveu o projeto da propulsão nuclear naval, liderada pelo Almirante Rickover, e construído pela empresa Westinghouse.
A construção da usina começou em 1954, antes mesmo da primeira criticalidade da propulsão nuclear do Nautilus, e foi concluída em tempo recorde, demonstrando a eficácia do programa. Em 1957, a Usina Nuclear de Shippingport entrou em operação, com a missão de gerar eletricidade de forma segura e eficiente, além de fornecer dados essenciais para o desenvolvimento de usinas nucleares civis.
A Usina Nuclear de Shippingport apresentava as seguintes características técnicas: utilizava um reator de água leve pressurizada (PWR – Pressurized Water Reactor) derivado da propulsão do Nautilus; tinha uma capacidade de produção de eletricidade de 60 megawatts, o que era considerável para a época; utilizava urânio enriquecido, tornando-se uma das primeiras usinas a fazer uso desse tipo de combustível; o reator era resfriado por água pressurizada, uma tecnologia que se tornou padrão em muitas usinas nucleares comerciais subsequentes, que hoje representam cerca de 80% do parque nuclear mundial.
Shippingport deu contribuições significativas para o desenvolvimento da tecnologia nuclear civil. Ela provou que a energia nuclear poderia ser usada de forma segura e eficaz para gerar eletricidade em grande escala. Além disso, a usina forneceu dados valiosos para o aprimoramento da segurança nuclear e estabeleceu um modelo de negócios para usinas nucleares comerciais nos Estados Unidos.
No entanto, o seu legado não se limita à engenharia e à ciência. Shippingport exemplificou o compromisso dos Estados Unidos com a iniciativa “Átomos para a Paz”, promovendo a cooperação internacional na utilização pacífica da energia nuclear. Isso contribuiu para aliviar as tensões da Guerra Fria e demonstrou o potencial da diplomacia nuclear.
Após décadas de operação, a Usina Nuclear de Shippingport foi desativada em 1982. A sua história continua a servir como um marco na história da energia nuclear e da diplomacia internacional, lembrando-nos da capacidade da tecnologia nuclear de servir à paz.
O artigo foi publicado originalmente na página no LinkedIn de Leonam dos Santos Guimarães.
Autor: Engenheiro Leonam dos Santos Guimarães – associado da ABEN
Imagens: Divulgação LinkedIn Leonam Guimarães
Fonte: Página no LinkedIn de Leonam dos Santos Guimarães